terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Azul-poesia

Eva Wilma como Blanca Estela Ramirez, em Azul Resplendor.

Uberlândia vive um novo e interessante capítulo de sua história cultural. Não que todas as dificuldades históricas de se fazer cultura tenham desaparecido de uma hora para outra, definitivamente não. Entretanto, o pleno funcionamento do Teatro Municipal nos mostra que um capítulo iluminado está sendo escrito a todo vapor e sua ambição maior é deixar marcado de uma vez por todas, o nome de nossa cidade no circuito nacional das artes cênicas.
A última emoção deste capítulo ainda em construção refere-se ao espetáculo “Azul Resplendor”, texto do dramaturgo peruano Eduardo Adrianzén, direção de Renato Borghi, grande nome do teatro brasileiro, e Elcio Nogueira Seixas. O palco do Teatro Municipal recebeu Eva Wilma, Pedro Paulo Rangel, Dalton Vigh, Luciana Borghi, Luciana Brites e Felipe Guerra para uma noite de homenagem aos oitenta anos de vida e sessenta de carreira de Eva Wilma.
A escolha do texto partiu da pesquisa sobre o teatro latino-americano realizada pelos diretores, que visitaram nossos vizinhos e colheram um riquíssimo material sobre a dramaturgia dos países e suas peculiaridades, o que vem se desdobrando em projetos, como a montagem de “Azul Resplendor”, e outros que ainda serão lançados.
Homenagear Eva Wilma e sua carreira brilhante é acima de tudo também reverenciar o teatro, essa proposta norteia toda a encenação, se desenvolve como uma metalinguagem sofisticada, pois encontra nos atores principalmente nos mais experientes, a sustentação necessária para a verossimilhança dos acontecimentos que envolvem os personagens e a realidade nua e crua dos profissionais de teatro, e da cultura em geral.
A metalinguagem é ainda mais poderosa quando se torna uma metáfora da vida em si, a chama de um fósforo que começa com a mágica da luz, avança para o fogo intenso, potente, até que, aos poucos, o calor se desvanece, e quando menos se espera, surge um azul semelhante ao usado para anoitecer os palcos, para assim chegar ao fim inevitável, seja do espetáculo, ou de uma existência. Esta imagem poética é impactante pela simplicidade, está colocada no início e no fim do espetáculo. O ofício do teatro é a própria metalinguagem da vida, isto porque, fazer teatro, estudar teatro, ver teatro nos liga diretamente com a efemeridade da vida e somos convidados a buscar em nós a melhor maneira de lidarmos com isso.
O conflito de gerações entre os personagens Blanca Estela Ramirez (Eva Wilma), Tito Tápia (Pedro Paulo Rangel) e os demais jovens atores, também é um tema bem exposto pela encenação, nos faz refletir como esse embate acontece no dia a dia em todos os setores da vida humana. O velho que é facilmente descartado para dar lugar ao novo, ao dito revolucionário, e muitas vezes sem nenhum embasamento que o qualifique, apenas a falsa pretensão da jovialidade de tudo querer modificar sem a sábia visão do amanhã.
Acredito ser importante deixar registrado momentos como este vividos
por todos que estiveram presentes nas apresentações de “Azul Resplendor”, pois vai além de apenas ter a oportunidade de conhecer pessoalmente o trabalho de atores consagrados e que costumamos ver pela televisão. É uma experiência mais profunda quando temos a real noção de que aquele momento da encenação não volta, mas suscitou em nós espectadores, questionamentos, dúvidas, lembranças, vitórias, fracassos e como o tempo vai nos auxiliando em colocar tudo em seu devido lugar.


Eduardo Humberto Ferreira
               Ator, graduado em Teatro (UFU)

FONTE: http://www.correiodeuberlandia.com.br/pontodevista/2013/12/02/azul-poesia/


Nenhum comentário: